Uma visita ao paraíso

O Globo, Revista O Globo, p. 70-73 - 29/08/2004
Uma visita ao paraíso
Expedição científica descobre novas espécies de animais e uma floresta intocada no coração do Amapá, um dos estados mais verdes do Brasil

Por Ana Lucia Azevedo

Nos últimos anos, o nome da Amazônia tem aparecido com freqüência cada vez maior na triste companhia de queimadas e moto-serras. Mas descobertas de uma expedição recém-concluída a uma floresta no coração do Amapá resgatam o brilho da Amazônia que encantou gerações de naturalistas. Os pesquisadores trouxeram da mata um leque de criaturas desconhecidas e relatos de uma das poucas regiões do planeta onde ainda é possível descobrir lugares onde nenhum homem pisou, animais e plantas que a ciência jamais registrou.
Organizada pela ONG Conservação Internacional (CI-Brasil), a expedição à Floresta Nacional do Amapá foi a primeira de uma série de 15 ao chamado Corredor de Biodiversidade do Amapá. O objetivo é inventariar a tão falada biodiversidade amazônica, que no Amapá parece continuar incólume à ação humana. Além de integrantes da CI, participaram representantes do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (Iepa), do Ibama, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e do Exército.
- O Amapá é a Amazônia em seu esplendor - disse, por telefone, Enrico Bernard, biólogo especialista na ecologia de morcegos e coordenador dos projetos do Programa da Amazônia na ONG Conservação Internacional, em Belém.
Bernard, um cientista de 30 anos que adora a vida no mato e detesta a idéia de ficar trancado num laboratório, chefiou a expedição de 22 pessoas e liderará também as próximas. O esplendor a que ele se refere se traduz em números. Pouco conhecido pela maioria dos brasileiros e bem menos explorado do que os demais estados amazônicos, o Amapá tem aproximadamente 96% de seu território ainda cobertos por vegetação intacta. Além disso, 54% do estado estão em unidades de conservação.
O isolamento e a pequena população - o Amapá tem 477.032 habitantes para uma área de 142.815.000 quilômetros quadrados - garantiram uma diversidade de ambientes ímpar: o maior manguezal do país, florestas de terra firme e várzea, cerrados e complexos de lagos. O resultado é uma floresta em que grandes mamíferos, como onças, veados e macacos ainda são comuns. A diversidade de peixes, anfíbios, répteis, aves e insetos só agora começa a ser contada. A copa das árvores - o chamado dossel - é um mundo à parte, por enquanto terra incognita.Nessa primeira expedição, foram 16 dias em campo que renderão meses de estudo em laboratório. Os pesquisadores ainda contabilizam suas descobertas - descrever uma espécie é um processo lento e minucioso. Porém, estão convencidos de que têm em mãos espécimes novos de sapos multicoloridos, lagartos, caranguejos e peixes - o Brasil é o país mais rico em peixes de água doce - e, talvez, um mamífero. Todos os exemplares serão enviados ao Iepa.- Para muitos cientistas é um sonho participar de uma expedição em que você fica isolado de qualquer contato com o mundo civilizado, imerso na floresta - empolga-se Bernard. A bióloga do Iepa Cecile Gama, especialista em peixes, surpreendeu-se com a abundância de espécies, mesmo nos menores cursos d'água. Córregos temporários, que cruzam a mata apenas na estação chuvosa, são o lar de espécies inteiramente novas para a ciência.- Coletamos desde peixinhos de dois gramas a espécies que ultrapassam os sete quilos - conta ela, por telefone, de Macapá. Ela, Bernard e os demais integrantes da equipe preparam-se agora para a próxima expedição: à ainda mais desconhecida selva das montanhas de Tumucumaque, o maior parque de florestas tropicais do mundo.

A floresta Nacional do Amapá tem 4.120 km2: mais de 3 vezes o tamanho do município do Rio

O Globo, 29/08/2004, Revista O Globo, p. 70-73
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