Tesouro submarino

CB, Ciência, p. 36 - 26/09/2009
Tesouro submarino
Pesquisadores mapeiam habitats existentes nas águas mais profundas do Banco de Abrolhos e descobrem uma área de corais sete vezes maior do que a conhecida até então. Estudo ajudará a melhorar políticas de preservação do lugar

Silvia Pacheco
Especial para o Correio

O Arquipélago de Abrolhos, no sul da Bahia,sempre foi sinônimo de beleza marinha. É lá que se encontra a maior biodiversidade do Atlântico Sul. Seus recifes de corais são os maiores e os mais ricos do Brasil, abrigando uma imensa variedade de espécies da fauna marinha, como peixes, crustáceos e algas. Um estudo coordenado pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP),no entanto,comprovou que a riqueza natural do lugar é ainda maior do que se acreditava. Ao analisar regiões mais profundas do oceano, os pesquisadores avistaram novos conjuntos de recifes, alguns com um tipo de formação até então não registrado pela ciência. Para se ter uma ideia, a área descoberta é sete vezes maior do que a anteriormente conhecida.
O Mapeamento dos habitats bênticos do Banco de Abrolhos resultou em um novo mapa da geografia subaquática da região e abre perspectivas para a ampliação da área do Parque Nacional Marinho de Abrolhos."A pesquisa reforça a necessidade de aumentar a região sob proteção legal", afirma Paulo Sumida, coordenador do levantamento. Segundo ele, a produção do mapa servirá também de subsídio para as políticas públicas implementadas na reserva." O conhecimento da área,do funcionamento do ecossistema e de suas inúmeras espécies, muitas das quais endêmicas, é fundamental para o manejo e gerenciamento da região."
O parque foi o primeiro do gênero a ser criado no país e corresponde a apenas a 2% do Banco de Abrolhos. No estudo, os pesquisadores vasculharam aproximadamente 46 mil quilômetros quadrados,em uma área chamada Plataforma de Abrolhos. Ela abrange as cinco ilhas que compõem o arquipélago, uma ilhota e um recife de formação vulcânica. Ali, a equipe mapeou os habitats bênticos (do fundo do oceano), descobrindo um mosaico de ambientes naturais até então praticamente desconhecidos, além de aprofundar o conhecimento sobre o conjunto de recifes rasos.
"Esse mosaico contribui para a heterogeneidade do banco, fornecendo uma imensa quantidade de nichos para uma infinidade de espécies. A presença de extensos bancos de rodolitos e de recifes mesofóticos (que vivem em condições intermediárias de luz) em áreas mais profundas (abaixo dos 30m) podem servir de abrigo para espécies de corais e agir como refúgios frente às mudanças climáticas, que possuem efeitos mais severos em águas mais rasas", explica Sumida.
O estudo - que durou quatro anos e faz parte de um projeto multidisciplinar denominado Produtividade e sustentabilidade do Banco de Abrolhos - revelou ainda a presença de conjuntos de corais com formação inusitada."São o que chamamos de buracas, encontradas na área de banco de algas calcárias a 90m de profundidade. Segundo nossos levantamentos, parecem não existir em nenhum outro lugar no mundo", diz o coordenador.
Tecnologia
Para vasculhar a área e realizar o levantamento desses recifes, a equipe de pesquisadores utilizou o navio oceanográfico Professor W.Besnard, do IOUSP, e embarcações de menor porte. Entre os equipamentos usados, destacam-se um sonar de varredura lateral para mapeamento do relevo dos fundos marinhos e um pequeno submarino operado por controle remoto para a tomada de imagens. Além disso, mergulhos técnicos profundos foram importantes para a documentação e coleta de amostras em vários locais.
O grande valor biológico da região não se restringe apenas aos recifes de corais.
Durante os meses de inverno, o Banco de Abrolhos é visitado por baleias jubarte,que ali se agregam para dar à luz os seus filhotes. A região costeira do banco também é margeada por manguezais, restingas, pradarias de "gramas"marinhas e macroalgas.
Segundo o diretor do Programa Marinho da Conservação Internacional Brasil,Guilherme Dutra,que participou do estudo,há uma importante conexão entre os recifes mais profundos descobertos, os recifes rasos e a zona costeira, formada principalmente pelos manguezais."Essa conexão é de grande importância para o ecossistema marinho, pois possibilita que várias espécies completem seu ciclo de vida", afirma.
É por isso que os pesquisadores acreditam que o mapeamento da área possa ajudar na preservação desse ecossistema, minimizando os impactos causados pelas comunidades ribeirinhas locais, que sobrevivem principalmente da pesca de extrativismo e do turismo. Essas atividades causam impacto não apenas diretamente, pela retirada de recursos vivos do sistema, como também indiretamente, por meio da ancoragem inapropriada de embarcações, aumento na quantidade de lixo, retirada de animais marinhos como suvenir, pisoteamento de corais expostos durante a maré baixa,derramamento de óleo, entre outros.
Tudo isso muito ligado à indústria do turismo." Divulgar os dados científicos e expor novos ambientes representa uma oportunidade para repensarmos os gerenciamentos costeiros.Com os dados em mãos, conseguimos ter uma voz ativa nas discussões de políticas ambientais", diz Sumida.
Segundo o oceanógrafo Marcelo Lourenço, que já dirigiu o parque nacional, o mapeamento trouxe dados que servem de subsídio para que a chamada zona de amortecimento, ao redor do parque, volte a ser preservada."Essa zona é de grande importância por conta da exploração de petróleo, que ocorre próximo ao parque.
Estudos concluíram que, se houver um vazamento de óleo, todo o ecossistema de Abrolhos será afetado, causando a morte dos recifes e impregnando os manguezais", explica.

CB, 26/09/2009, Ciência, p. 36
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