Sem-terra ameaca sitio arqueologico

OESP, Nacional, p.A8 - 28/01/2005
Sem-terra ameaça sítio arqueológico
No Piauí, grupo ligado à Fetag promete manifestação hoje para aumentar assentamentos no Parque da Capivara
Carlos Marchi
A arqueóloga Niède Guidon, que descobriu e pesquisa as pinturas rupestres do Parque da Capivara, no Piauí, denunciou ontem ao Estado que sem-terra comandados pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag), do Piauí, que estão acampados na periferia do parque, fariam hoje, na cidade de São Raimundo Nonato (PI), uma manifestação em favor do aumento de assentamentos na região onde ela pesquisa. O Parque da Capivara foi declarado reserva nacional pelo governo brasileiro e Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco.
A socióloga francesa Anne-Marie Pessis, que acompanha Niède nas pesquisas, disse que o problema com os sem-terra começou este ano e a criação de acampamentos em volta do parque foi estimulada pela coordenação estadual do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no Piauí. Segundo ela, os sem-terra levados para esses acampamentos são de outras regiões. "Nós trabalhamos lá há 25 anos. Conhecemos as pessoas da região."
Niède acusou os sem-terra de estarem "invadindo o parque aos poucos" e ameaçando os sítios arqueológicos. Explicou que a região recebe grande quantidade de turistas estrangeiros e esse fluxo é constantemente ameaçado pelos acampamentos de sem-terra, que criaram um clima de instabilidade.
Ela disse que já pediu aos governos estadual e federal que assentem os sem-terra em outras regiões, pois o Parque da Capivara é zona de caatinga. "Lá não é possível nenhuma prática agrícola. Os sem-terra arrancam a vegetação natural e matam os poucos animais para comer. Lá, arrancar a vegetação natural significa criar um processo irreversível de desertificação." A arqueóloga, que ganhou renome mundial por descobrir as pinturas rupestres que são a mais antiga manifestação cultural do homem em território brasileiro, disse que a vocação natural da região é explorar o turismo arqueológico, que atrai a atenção de estrangeiros.
Niède explicou que seu trabalho criou na periferia do parque núcleos de apoio às comunidades locais, com escolas e atendimento básico de saúde. Ela contou que nunca teve problemas com os nativos da região. As informações das duas foram confirmadas pela professora Suzana Sampaio, ex-presidente da ONG Icomos-Brasil (International Council of Monuments and Sites), que compartilha a denúncia.
A manifestação
Os sem-terra não pensam assim. Tanto que a manifestação marcada para hoje sairá dos arredores da cidade até uma concentração na Praça do Relógio, no centro, para os discursos. Depois disso a passeata deve seguir até a frente da Fundação Museu do Homem Americano (Fundham), instituição montada por Niède e elogiada internacionalmente. A manifestação vai atribuir à Fundham e à pesquisa arqueológica o atraso da reforma agrária na região.
A coordenação do MST no Piauí negou ligação com a manifestação denunciada por Niède e Anne-Marie, e informou que os sem-terra acampados perto do Parque da Capivara são organizados e comandados pela Fetag. As lideranças da Fetag não foram localizadas pelo Estado para detalhar a manifestação.
O capitão Edvaldo Viana, que comanda o quartel da Polícia Militar em São Raimundo Nonato, confirmou que a manifestação ocorrerá hoje cedo e sua tropa recebeu reforço do governo estadual. Niède contou que fez um apelo ao governador Wellington Dias (PT) para que a tropa da PM em São Raimundo Nonato fosse reforçada, para impedir violências contra o museu.

OESP, 28/01/2005, p. A8
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