Projeto vai mapear arte rupestre na Bahia

OESP, Vida, p. A20 - 27/09/2006
Projeto vai mapear arte rupestre na Bahia
O pesquisador Carlos Alberto Etchevarne recebeu R$ 532 mil de um prêmio para produzir livro e atlas dos sítios arqueológicos do Estado

Cristina Amorim

Os brasileiros conhecem pouco do Brasil pré-colonização portuguesa - tanto que pintura rupestre no quintal beira a normalidade no interior do Nordeste, reflexo da ignorância sobre sua importância. Um projeto da Universidade Federal da Bahia (UFBA) pretende preencher pelo menos parte deste vazio.

O arqueólogo Carlos Alberto Etchevarne acaba de receber R$ 532 mil para realizar o primeiro levantamento sistemático dos desenhos na Bahia. Ele foi o vencedor do 3o Prêmio Clarival do Prado Valladares, concedido anualmente pela Organização Odebrecht, e produzirá um livro e um atlas dos sítios arqueológicos, para aumentar o nível de conhecimento da população e das autoridades.

As pinturas rupestres estão espalhadas pelo Estado ao longo da Bacia do Rio São Francisco, pela Chapada Diamantina, no cerrado e na caatinga - só no litoral elas não foram avistadas ainda. São marcas deixadas por índios pré-históricos, grupos nômades de caçadores-coletores que perambulavam pela região num passado remoto atrás de comida como frutas e peixe.

Hoje em dia algumas estão dentro de propriedades particulares, cujos donos com freqüência não têm noção de sua importância histórica. Outras estão localizadas em áreas com pedreiras, que extraem granito, quartzito e arenito para revestir casas pelo País afora.

PERGUNTAS

Os desenhos são representações de plantas, como palmeiras; animais, como emas e capivaras; e pessoas, além de símbolos geométricos. "Algumas das espécies representadas conseguimos identificar, outras não. Na Bahia, ao contrário de pinturas de outros Estados, os desenhos de plantas são bastante freqüentes", explica Etchevarne. As figuras humanas chegam a ter detalhes como cocares e tacapes.

As pinturas foram feitas com o que o índio tinha em mãos: pigmentos minerais de hematita, carvão e tabatinga (um tipo de argila branca) em cavernas que serviam de moradia provisória. Por isso vermelho, amarelo, branco, preto e seus matizes predominam.

Os arqueólogos sabem pouco mais do que isso. Os poucos estudos já feitos na região eram pontuais. Não se sabe com certeza que grupos eram estes, quando viveram nem quantos eram. Não se conseguiu ainda traçar uma ligação de ascendência entre os índios pré-históricos desenhistas e os atuais - na verdade, não se sabe nem se tal relação existe. Pesquisadores da Universidade de São Paulo acabaram de coletar material para tentar a primeira datação das pinturas baianas.

RESPOSTAS

Etchevarne e sua equipe farão viagens a campo para fotografar e registrar o maior número possível de sítios. "Não temos a menor idéia de quantos existem. Teremos a primeira noção agora. Alguns estão localizados no quintal das casas." Ele conta que recentemente o proprietário de um terreno em Lençóis descobriu uma caverna com pinturas só depois de uma queimada, que abriu a mata até a caverna.

O desconhecimento do patrimônio histórico não é exclusividade da Bahia. O mesmo ocorre em boa parte dos Estados onde há desenhos rupestres no Brasil. Eles estão difundidos em cavernas no Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

À medida que o desmatamento e a queimada avançam nessas regiões, some a proteção natural das cavernas. As pinturas, antes guardadas pelas árvores, ficam sujeitas a mais luz, vento e chuva - sem contar a presença do homem, que sem conhecimento se torna uma grande ameaça (leia texto acima).

O arqueólogo da UFBA espera que seu trabalho, além de ser uma ferramenta para cientistas, ajude autoridades locais a educarem os moradores sobre a importância da preservação e a estabelecerem políticas de proteção.

Etchevarne também imagina que as cavernas poderiam servir como fonte de renda pelo turismo responsável. "Seria uma forma de proteger e obter recursos, não pelo turismo maciço, mas por programas seletivos."


População destrói sítios arqueológicos no Piauí

Cristina Amorim

Pinturas rupestres que estão entre as mais antigas já datadas no Brasil, de 12 mil a 3,5 mil anos, são destruídas propositalmente pela população pobre de São Raimundo Nonato (PI). Localizadas no entorno do Parque Nacional da Serra da Capivara, elas são cobertas pela fuligem de pneus queimados embaixo para driblar a fiscalização do Ibama e evitar que novas áreas sejam protegidas - o que dificultaria a caça de tatus e outros animais da caatinga, carnes apreciadas na região. Não é possível limpar os desenhos - a ação os danifica de forma irremediável.

O parque foi tombado pela Unesco em 1991 como Patrimônio Cultural da Humanidade e protege desenhos importantes para explicar o povoamento humano da América do Sul. Até agora foram registrados mais de 900 sítios, entre os quais cerca de 650 apresentam pinturas rupestres. Mas sua criação em 1979 desagradou proprietários de terra e moradores de toda a área. Até hoje há desapropriações em andamento e tentativas de caça e desmatamento dentro do parque e ao seu redor.

Ainda que o parque proteja boa parte dos desenhos, há sítios espalhados por outros pontos do Estado, inclusive entre a Serra da Capivara e o Parque Nacional Serra das Confusões. Um corredor ecológico entre eles, que também ajudaria a preservar o patrimônio arqueológico, ainda está em discussão.

OESP, 27/06/2006, Vida, p. A20
Arqueologia

Unidades de Conservação relacionadas

  • UC Chapada Diamantina
  • UC Serra da Capivara
  • UC Serra das Confusões
  •  

    As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.