Insegurança é rotina em parques

JB, Cidade, p. 12 - 25/02/2005
Insegurança é rotina em parques
Em número reduzido, fiscais da Serra da Bocaina, Itatiaia e Serra dos Órgãos convivem com ameaças

Fiscais dos parques nacionais Serra da Bocaina, Serra dos Órgãos e de Itatiaia recebem as mesmas ameaças que culminaram no assassinato de Dionísio Julio Ribeiro Filho, na noite de terça-feira, na Reserva Biológica do Tinguá, em Nova Iguaçu. Os parques foram citados pelo gerente executivo do Ibama, Edson Bedin, como prioritários na questão de reforço de segurança.
- Esses parques sofrem os mesmos riscos. O Brasil é um país que ainda mata defensores da natureza - afirma Bedin.
Maior parque nacional no Estado do Rio, o da Serra da Bocaina, na região Sul fluminense, com 104 mil hectares, é mais um endereço explorado pelos palmiteiros. O chefe do parque, Daniel Toffoli, enfrenta há pelo menos um ano ameaças constantes contra os funcionários do local.
- São apenas três fiscais, além de mim, para dar conta de todo o parque. Eles (os palmiteiros) vêm de madrugada, mas são muitos, e nós, apenas quatro - lamenta Toffoli.
Os palmiteiros agem principalmente nas encostas de Angra dos Reis e Paraty, fazendo o comércio do palmito na Via Dutra e na BR-101.
Em Teresópolis a situação não é diferente. O chefe do Parque Nacional Serra dos Órgãos, Ernesto Bastos Viveiros de Castro - que era amigo do ambientalista morto no Tinguá -, conta que o momento da autuação de irregularidades é a hora mais propícia para ameaças.
- ''Cuidado por onde você anda'', ''nós conhecemos sua família'' são algumas das estratégias de intimidação usadas por eles - conta Ernesto.
Há um mês, com a ajuda da Polícia Federal, dois palmiteiros foram presos. Eles cortaram o palmito e o deixaram na mata, sendo detidos quando voltaram para buscar a carga, de madrugada.
- São apenas quatro fiscais. Eu acredito que um novo concurso no Ibama poderia ajudar a solucionar o problema. O Ibama, no Brasil inteiro, tem menos funcionários que o aeroporto do Rio - lamenta o chefe do parque.
O Parque Nacional de Itatiaia foi o primeiro criado no Brasil, em 1937. São 30 mil hectares, abrangendo os municípios de Resende, Itatiaia, Itamonte, Alagoas e Bocaina de Minas. Em 1999, o gerente de fiscalização do parque, Tarcílio Carvalho, numa ação de combate aos palmiteiros, parou uma Kombi carregada de palmito e, na ação, feriu um dos criminosos, que acabou morto. Fontes ligadas ao parque informam que, desde então, os funcionários estão jurados de morte, numa tentativa de ''empate''.
O chefe do parque, Luiz Sérgio Sarahyba, não foi encontrado para esclarecer em que condições encontra-se o parque atualmente.
As ameaças, no entanto, não partem só de palmiteiros. Rodrigo Varela, chefe da Reserva Biológica de Poço das Antas, em Silva Jardim, já foi ameaçado por denunciar a extração irregular de recursos minerais.
- O Disque-Denúncia registrou uma informação de que um grupo da Lagoa de Juturnaíba estaria se organizando para me matar. Mas eu não mudei minha rotina. Sempre que necessário, peço apoio da Polícia Civil e Militar - conta Rodrigo.
Há mais de um ano a reserva está sem o apoio da base aérea de São Pedro d'Aldeia na fiscalização. Durante os vôos de treino dos militares, um funcionário do Ibama ia junto no helicóptero. No período, segundo Rodrigo Varela, diminuiu a ação dos predadores, pois a presença do helicóptero intimidava a população.
- A fiscalização aérea é fundamental para combater a presença dos palmiteiros. Ano passado foi preso um homem que fornecia para Niterói. Eles retiram o palmito, vendem cada peça a R$ 0,50 e o intermediário repassa a R$ 6.

Polícia prende suspeito no Tinguá

Policiais prenderam, na noite de quarta-feira, um suspeito de ter assassinado o ambientalista Dionísio Júlio Ribeiro, morto na terça, em Nova Iguaçu. José Reis Medeiros Alves, 40 anos, que estava foragido da Justiça, foi apontado como o autor do crime numa ligação feita para o Disque-Denúncia. Ele foi preso em casa, na Rua da Administração, onde também morava Dionísio.
Em depoimento na Delegacia de Homicídios, José negou envolvimento com o crime. Ele contou ''conhecer de vista'' Seu Júlio, como era chamado o ambientalista, há cerca de 15 anos, mas disse nunca ter tido qualquer problema com ele. José, entretanto, admitiu que catava frutas na Reserva do Tinguá e que, às vezes, ''amarrava uns laços para pegar gambá''.
- Nunca peguei nada lá. Para mim, alguém que está querendo se limpar jogou a culpa em cima de mim. Ele (Seu Júlio) se envolvia com política, com brigas em escola. Não sei quem matou, mas não acho que foi um caçador. Se fosse por isso, ele já tinha sido morto há tempos - disse José, natural de Minas Gerais, no Rio desde os três anos.
Ele responde a dois processos por homicídio, em Miguel Pereira e Mendes, além de ter sido condenado a 13 anos por um assassinato. José alega que cometeu dois crimes, um contra o ex-marido de sua irmã, que a ameaçava, e outro contra José Carlos Baltar, que matou seu irmão e ameaçava sua família. Ele contou que estava em Nova Iguaçu há cerca de seis meses, apesar de ter dito em depoimento que veio para o Rio há oito meses.
O delegado Rômulo Vieira afirmou que investiga o envolvimento de José com o ambientalista. Segundo ele, o biscateiro ficará preso porque era foragido. José cumpriu pena por mais de sete anos em Bangu 2 e estava em regime aberto. Morava com um amigo, identificado apenas como Paulinho, e tem uma filha de 10 anos, que mora com os avós maternos.
- Seu passado conspira contra ele, mas não podemos afirmar que ele matou Seu Júlio - disse Rômulo.

Palmito: um vidro por planta

Cada pote de palmito vendido em supermercados equivale a uma árvore derrubada. Na Mata Atlântica, a espécie devastada pela ação dos palmiteiros é a Euterpe eduli, ou palmito-juçara.
- O problema desta espécie é que a árvore inteira tem que ser retirada - explica Ricardo Carneiro da Cunha Reis, botânico e consultor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
O palmito-juçara tem o crescimento muito lento nos primeiros quatro anos, e uma nova planta leva quase uma década para atingir o manejo ideal para consumo. Por estas razões sua derrubada é ilegal.
- É fundamental que haja o replantio, por isso, a extração da espécie deve ser acompanhada por engenheiros florestais - diz.
Os frutos e sementes da espécie são importantes para a sobrevivência de vários animais.
O chefe do Parque Nacional da Serra da Bocaina, Daniel Toffoli, relaciona a extração do palmito com a caça de animais silvestres.
- Os palmiteiros retiram as árvores e aproveitam para levar também os animais que se alimentam dos frutos. Isso é muito comum - afirma Toffoli.

JB, 25/02/2005, Cidade, p.12
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