Parque da discórdia
Ibama arma confusão ao querer triplicar a reserva da Canastra
José Edward
A Serra da Canastra, no sudoeste de Minas Gerais, é uma espécie de berçário de rios. Lá, nascem afluentes de duas das principais bacias hidrográficas do país: a do São Francisco e a do Paraná. A região é o habitat de animais ameaçados de extinção, como o lobo-guará e o tamanduá-bandeira, e abriga trechos de mata atlântica e uma cachoeira de quase 200 metros, a Casca d'Anta. Para proteger esse tesouro ambiental, o governo criou em 1972 o Parque da Serra da Canastra. Ele deveria se estender por 200.000 hectares, mas cobre apenas 35% dessa área porque, na ocasião, a União não contava com dinheiro suficiente para indenizar todos os que tinham propriedade no local. Nas últimas três décadas, portanto, a serra continuou a ser explorada, sobretudo pela agropecuária e pelas mineradoras. No ano passado, o Ibama resolveu que o parque deveria ter as dimensões previstas no projeto original.
Por causa da decisão, o Ministério Público determinou que fossem suspensas as atividades que afetam a área a ser desapropriada. Dezenove mineradoras que extraíam quartzito na região foram fechadas, porque contribuíam para assorear as nascentes dos rios. Com isso, cerca de 5.000 pessoas perderam o emprego. No município de Alpinópolis, vizinho da serra, a agropecuária foi paralisada, porque o Ibama proibiu o uso de agrotóxicos, queimadas e a troca de vegetação nativa por capim. As lavouras de café, soja e batata, tradicionais da região, tornaram-se inviáveis. O desemprego abalou o comércio de Alpinópolis e cidades vizinhas. O mercado imobiliário encontra-se paralisado, pois ninguém quer comprar propriedades que podem ser engolfadas pelo parque.
Estima-se que, para levar o projeto adiante, o Ibama terá de desapropriar 1.200 propriedades rurais e pagar as respectivas indenizações a seus donos. Além disso, será necessário remover povoados onde moram 1.500 famílias e estão instaladas dezenas de empresas. "Todos serão indenizados", diz Valmir Ortega, diretor do Ibama. A promessa do governo não convenceu os moradores da região. A União terá de gastar pelo menos 500 milhões de reais para aumentar o parque. E o currículo governamental está longe de ser confiável. Há donos de áreas desapropriadas nos anos 70 que ainda não foram ressarcidos integralmente. O projeto do Ibama também encontra objeção entre os ambientalistas. Eles argumentam que é inútil expandir o parque, pois o governo não fiscaliza adequadamente nem mesmo as terras que já estão sob sua custódia. Afirmam ainda que o projeto é ultrapassado, porque engloba desnecessariamente algumas áreas e deixa de fora outras que deveriam estar sob tutela federal. A principal é o Córrego Samburá, onde está a nascente do Rio São Francisco. Descoberta em 2001, ela fica fora do parque, ao norte da Serra da Canastra. A área que o governo quer incorporar fica ao sul. O Ibama alega que está apenas cumprindo a legislação de 1972 e só o Congresso tem poder para mudá-la. Se ela representa um desastre, que seja alterada quanto antes.
Veja, 11/01/2006, p. 87
UC:Parque
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