Resex Baixo Rio Branco - Jauaperi: ainda sem resposta

WWF - www.wwf.org.br - 17/03/2010
Os peixes estão cada vez mais escassos no rio Jauaperi, afluente do Rio Negro localizado na divisa dos estados do Amazonas e Roraima. Acostumados a pescar para subsistência, os ribeirinhos que moram nas comunidades ao longo do rio contam que a pescaria diária que antes levava meia hora, agora leva três. O pirarucu, peixe típico da Amazônia, já não é mais encontrado na região. Os quelônios, antes abundantes, também estão ameaçados.

Preocupados com a situação, os ribeirinhos querem ter a possibilidade da exploração dos recursos naturais da sua terra - tais como peixes, castanha, cipó e madeira - de modo sustentável, garantindo sua estabilidade econômica e preservação do meio ambiente.

Foram esses motivos que os levaram a solicitar, em 2001, a criação de um reserva extrativista na região do Baixo Rio Branco-Jauaperi. "Eu sei que se a gente não cuidar da natureza, não vai ter nada para meus filhos. Estamos sentindo isso na pele", afirma Francisco Pairede Lima, morador da comunidade de Itaquera, situada no rio, e presidente da Associação de Artesãos do Rio Jauaperi (AARJ).

Todos os processos de requisição da criação da unidade de conservação foram cumpridos: o estudo da importância ecológica da área, as consultas públicas com as comunidades e, em 2007, o processo foi transferido do Ministério do Meio Ambiente (MMA) para a Casa Civil da Presidência da República. Depois de um longo tempo sem nenhuma resposta, no dia 1 de março de 2010 o processo de criação da área foi enviado de volta ao MMA. Enquanto o governo não toma uma decisão, os moradores do Baixo Rio Branco-Jauaperi sofrem conseqüências da demora e incerteza quanto ao seu futuro.

No rio Jauaperi, as cerca de 150 famílias que vivem na região, espalhadas em comunidades, como Samaúma, Itaquera, Gaspar, São Pedro, Remanso, Tanauaú, Floresta, Xixuaú e Palestina - recentemente visitadas pela equipe do WWF-Brasil -, sofrem cada vez mais com a invasão de caçadores de quelônios e pescadores comerciais que infringem o acordo de pesca vigente no rio, o qual permite apenas a prática para subsistência.

Tais pescadores comerciais entram no rio com seus barcos geleiros, assim chamados porque contém grandes isopores de gelo onde são estocados os peixes, e pescam com rede no local. As redes são colocadas por canoas nas margens opostas do rio e capturam todos os animais que passam, entre jacarés, botos, quelônios, peixes e arraias. Os pescadores então escolhem os peixes que lhes interessam e dispensam no rio os outros animais já fracos e machucados ou mesmo mortos.

Essa invasão de pescadores tem gerado sérios conflitos entre os atores sociais na área. Aqueles moradores que estão determinados em proteger o rio e denunciar os geleiros (pescadores comerciais) são constantemente ameaçados de morte.

Outro impacto é que, cansadas de esperar uma decisão em torno da reserva e sem alternativas econômicas, algumas pessoas das próprias comunidades estão se rendendo à pesca comercial para sobreviver. "Com a demora da criação da resex, nosso trabalho de conscientização dos moradores do rio está indo por água abaixo. Muitos estão começando a não acreditar mais na gente", conta Rozan Dias da Silva, agente ambiental voluntário e morador da comunidade de Itaquera.

Para o WWF-Brasil, a criação da reserva extrativista é urgente. "Além da reserva ser essencial para proteger uma área considerada altamente prioritária para conservação da natureza devido à diversidade biológica, ela garantirá a essas comunidades a manutenção dos recursos naturais necessários para sua sobrevivência e a melhoria das condições de vida", afirma Francisco Barbosa, coordenador do Programa de Áreas Protegidas da Amazônia e apoio ao Arpa.

"Quero muito que a resex saia esse ano, porque acho que depois não sai mais", diz Aluizio Barroso Nascimento, da comunidade de Samaúma, com esperança de uma resposta positiva em 2010. "A esperança da reserva eu ainda não perdi. Tenho fé que uma hora dessas pode vir uma notícia boa", fala Sr. Chico Caetano Felix, morador da comunidade de Floresta.

Contexto nacional e internacional:

2010 foi declarado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Ano Internacional da Biodiversidade, , e é, por isso, uma importante oportunidade para reunir esforços de conservação frente ao crescente número de espécies ameaçadas de extinção.

Em outubro deste ano será realizada em Nagoya, Japão, a 10 Conferência das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (COP-10/CDB), quando os países-membros irão avaliar a execução do plano estratégico da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), ou seja, discutirão se o mundo conseguiu cumprir a meta de reduzir a perda de biodiversidade.

A criação de unidades de conservação faz parte da estratégia do governo brasileiro, que assumiu nacional e internacionalmente - na CDB - o compromisso oficial de proteger 30% da Amazônia brasileira em unidades de conservação. Considerando essa porcentagem, ainda restam 14 milhões de hectares a serem destinados a unidades de conservação na região Amazônica.

"No ano internacional da biodiversidade e nesse momento de preparação para a COP em Nagoya, precisamos unir esforços pela conservação dos ecossistemas terrestres e aquáticos. A criação da resex Baixo Rio Branco-Jauaperi seria uma importante conquista nesse sentido, uma vez que o Brasil é o primeiro país em diversidade biológica e deve ser um bom exemplo de cumprimento de metas para outros países no cenário mundial", aponta a secretária-executiva do WWF-Brasil, Denise Hamú.

Importância ecológica:

A área destinada à resex Baixo Rio Branco-Jauaperi tem aproximadamente 580 mil hectares, distribuídos entre os municípios de Rorainópolis, em Roraima, e Novo Airão, no Amazonas. Moram na área aproximadamente 150 famílias, que vivem da pesca artesanal, da extração de castanha do Brasil e produção de artesanato. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, a conservação dessa área é considerada de extrema importância e prioridade.

Estudos realizados em 2004 na região, em função da demanda de criação da reserva extrativista Baixo Rio Branco-Jauaperi, destacam a riqueza da biodiversidade da região. A combinação de águas cristalinas (afluentes do Jauaperi), branca (Rio Branco) e negra (Rio Jauaperi e Negro) proporciona uma grande diversidade de espécies de plantas e animais, além de uma maior ocorrência de endemismo de espécies.

Composta por florestas inundadas, com várzeas e igapós, e florestas de terra firme, a região abriga plantas como o açaí, a andiroba, o buriti, castanha-do-Brasil e taperebá, muitas delas usadas pela população local para a alimentação. O cipó e a massaranduba são outras espécies encontradas no local que permitem a produção de artesanatos.

Os estudos também indicaram a existência de 42 espécies de mamíferos na região, das quais 10 encontram-se na lista oficial de mamíferos ameaçados de extinção, incluindo a onça-parda, jaguatirica, ariranha, lontra, tamanduá, tatu-canastra, macaco-aranha e o peixe-boi. Também são encontrados na área o cabeçudo, espécie de quelônio mais caçado para o comércio ilegal, a tracajá, a irapuca e a tartaruga-da-Amazônia.

A variedade da ictiofauna também é significativa na região. Nesse cenário, a pesca se tornou essencial para manutenção dos meios de vida da população local, tanto para subsistência alimentar como para o comércio. Dentre as espécies encontradas na região destacam-se o jaraqui, pacu, barbado, piranha, sardinhão, surubim, pirarara, a piranha-preta (alimentação); o acari, bodó-pintado, borboleta, cará-disco, cardinal, lápis e o vela (peixes ornamentais) e o tucunaré (pesca esportiva).

Rozan faz a diferença no Jauaperi

Morador da comunidade de Itaquera, situada às margens do Rio Jauaperi, Rozan foi o prático do barco que levou a equipe do WWF-Brasil ao Rio Jauaperi. Além de prático, ele divide seu tempo entre o trabalho artesanal e a defesa do meio ambiente: Rozan é agente ambiental voluntário
UC:Reserva Extrativista

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