Montanha de dúvidas

http://www.manuelzao.ufmg.br - 12/04/2006
A movimentação na pequena e pacata Joaquim Felício, município situado a cerca de 270 Km de Belo Horizonte, no baixo Velhas, no dia oito de fevereiro indicava a realização de um grande evento. Funcionários da prefeitura varriam as ruas da cidade; havia grande número de carros e na Escola Municipal Odília Costa, o chão era lavado, cadeiras eram organizadas num auditório improvisado e a mesa e os corredores eram enfeitados. Toda essa preparação foi feita para receber a comitiva encarregada de apresentar, para os moradores do município e da vizinha Buenopólis, a criação do Parque Estadual da Serra do Cabral. Compareceram o secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais, José Carlos Carvalho, o ambientalista Hugo Werneck, o diretor do Instituto Estadual de Florestas, Humberto Candeias e os coordenadores do Projeto Manuelzão, Apolo Heringer Lisboa, Tarcísio Pinheiro e Antônio Leite. A Serra abrange os municípios de Várzea da Palma, Lassance, Augusto de Lima, Buenopólis, Joaquim Felício, Corinto e Francisco Dumont.

A apresentação foi transformada em um grande fórum de discussão sobre o parque e o seu processo de criação. Na abertura da solenidade, os cerca de 120 presentes ouviram a prefeita de Joaquim Felício, Eliana Colen (PMDB), expor suas preocupações quanto à criação do parque. Ela questionou o pouco tempo da consulta pública à população, defendeu o garimpo de quartzo, a coleta das sempre-vivas e a pecuária na Serra do Cabral. Eliana também disse que há uma cultura de preservação da área pelos moradores. O prefeito de Buenopólis, José Alves (PT), reforçou as palavras de sua colega de Joaquim Felício. Os dois foram muito aplaudidos em suas falas.

Alguns moradores e proprietários de terras na área do parque, chamados à tribuna para falar, repudiaram a criação da reserva de proteção ambiental. "Não acredito no funcionamento do parque. Que garantias vamos ter que ele vai funcionar", afirmou Dalton Menezes, que possui propriedade na parte baixa da área destinada ao parque. Ele lembrou que a criação da APA (Área de Preservação Permanente) Municipal, em 1999, "não conseguiu sair do papel, por falta de recursos". E ainda perguntou: "será que as APAs devidamente criadas não conseguiriam preservar o parque?". Célio Caldeira, outro proprietário de terras e parceiro do Projeto Manuelzão em algumas atividades na área, sugeriu que o Estado faça parcerias com os proprietários, de forma que eles se comprometam com a preservação da área. Em contrapartida, os donos da terra poderiam vendê-las para quem quiserem. Ou seja, os proprietários veriam se seria vantajoso para eles esse sistema, caso não seja poderiam vender as terras para qualquer um.

A polêmica da criação do Parque Estadual da Serra do Cabral não está na área do parque, mas sim na área destinada à reserva extrativista. O decreto No 44121/2005, que cria o parque, prevê a criação de uma reserva extrativista em anexo. O Parque e a reserva terão área de cerca de 22 mil hectares, enquanto a Serra do Cabral possuiu, aproximadamente, 218 mil hectares A reserva permitirá aos moradores da região a continuidade das atividades econômicas desenvolvidas na área, como, por exemplo, coletar as sempre-vivas e extrair o quartzo. Mas para isso terão que se organizar em cooperativas e se registrarem no órgão ambiental. A delimitação do parque tomou o cuidado de excluir grande parte das atividades econômicas da região, para que os moradores da região não fossem prejudicados.

O Diretor do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Humberto Candeias, garantiu que há recursos assegurados para a criação do parque e que já foi feito concurso público para escolher o gerente da área. O Diretor esclareceu que as controvérsias existentes sobre a criação do parque são fruto da falta de informação e que o desejo da população de revogar o decreto não é possível, pois "só se pode alterar uma área de unidade de conservação por decreto, se for por lei". Além disso, Humberto Candeias disse que "existe um conflito político e de interesses pessoais, claramente notados na reunião. Questão de individualismo não pode passar pelo nosso propósito". Para José Carlos, morador de Joaquim Felício, a recusa de alguns proprietários de criar o parque se deve ao lucro que os atravessadores têm em manter a exploração dentro de suas propriedades. José Carlos ainda acusou um dos proprietários: "o Célio está vendendo o peixe dele. Ele é o único comprador em Joaquim Felício do que é produzido na Serra. Com o parque as pessoas poderiam ganhar mais e a Serra não seria depredada". Já Célio Caldeira se defende: "todo comércio é assim, as pessoas põem os impostos, sua margem de lucro e vende. Então se alguém acha que eu compro muito barato e vendo muito caro, ele leva a mercadoria para mim e coloca o preço que ele quiser que eu vendo para ele por 25 - 30% a mais".

O Secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, José Carlos Carvalho, lamentou a falta de diálogo com a comunidade no processo de criação do parque e assumiu o compromisso de discutir com a comunidade a demarcação da reserva extrativista. Nos novos estudos serão respondidas questões que não foram colocadas no primeiro levantamento, como o número exato de moradores dentro do parque.

Por: Humberto Santos
UC:Parque

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